Como o líder deve se comportar perante uma declaração de problema de saúde mental.

A saúde mental no ambiente de trabalho tem se tornado uma preocupação crescente, especialmente em tempos de mudanças rápidas e estresse elevado. Quando um colaborador revela um problema de saúde mental, a maneira como o líder reage pode ter um impacto profundo na sua recuperação e no ambiente organizacional como um todo. Exploraremos neste artigo as melhores práticas para que líderes que se deparam com essa situação, possam escolher transformar um momento tenso para o colaborador em um momento acolhedor e seguro para todos. 

O momento da declaração de um problema de saúde mental envolve um processo interno de profunda elaboração e superação de um medo considerável, a tomada desta decisão só acontece quando, aquele que está em sofrimento, percebe que o seu sofrimento é maior e mais prejudicial do que risco de contar sobre ele. 

“Ao tocar no assunto, a pessoa fez algo difícil e arriscado. Na maioria dos casos, uma longa reflexão é necessária para tomar a decisão.” Kelly Greenwood. 

E então quais são as melhores práticas que o líder pode adotar para lidar de forma adequada com este momento? 

  1. Receptividade e Escuta Ativa

O primeiro passo é criar um espaço seguro onde o colaborador se sinta à vontade para falar sobre sua saúde mental. Quando alguém se abre sobre um problema dessa natureza, é fundamental que o líder escute com atenção, sem interromper ou julgar. A escuta ativa envolve prestar atenção total ao que o colaborador está dizendo, demonstrando empatia e reconhecimento dos sentimentos e dificuldades expressos. Este tipo de atitude constrói confiança e mostra que o líder se importa genuinamente com o bem-estar da equipe.

“Se nada mais acontecer na primeira conversa, ao menos tenha certeza de ter agradecido pelo compartilhamento.” Kelly Greenwood. 

Kelly Greenwood sugere que a reação do líder neste momento deve ser o mais natural possível, de forma que não valorize a situação para que o colaborador não interprete como algo muito sério, tão pouco se comporte de forma diferente do habitual. E Goldberg sugere que o líder preste atenção a sua reação emocional, para que o colaborador não tenha que lidar com a emoção do líder ao mesmo tempo que está tendo de compreender e lidar com as suas próprias emoções. 

Escute atentamente, perceba as reações não verbais bem como possíveis alterações na voz. Estimule a fala com cuidado, fazer muitas perguntas pode deixar o colaborador desconfortável emocionalmente, lembre-se que o colaborador está em sofrimento, e provavelmente se sentindo exposto e inseguro no momento da conversa. 

Permita que o colaborador conduza a conversa e que defina o que e como quer te contar sobre a sua condição atual. 

2. Respeito à Privacidade e Confidencialidade

A privacidade é um aspecto crítico quando se trata de saúde mental. O líder deve assegurar ao colaborador que as informações compartilhadas serão mantidas em sigilo, mas que para que possa oferecer o apoio necessário e seguindo as normas da organização, precisará compartilhar a informação com um profissional da área de Recursos Humanos, verifique se o colaborador se sente à vontade sobre esta ação e que, caso ele se sinta mais seguro, inicialmente você poderá manter sigilo sobre a sua identidade até que esteja preparado para ser identificado, mantendo o sigilo para o restante da empresa. 

Manter essa confidencialidade não só é uma questão de ética, mas também de respeito e confiança.

3. Não desvie a atenção para si

Quando se trata de como os distúrbios se manifestam, é importante ter consciência de que não há um padrão, portanto se você já enfrentou algum distúrbio desta ordem ou conhece alguém que o tenha, não procure por padrões ou parte do pressuposto que entende a situação pela qual o colaborador está passando, escute atentamente como está se manifestando para este colaborador. 

Caso tenha uma história semelhante para contar ao colaborador, certifique-se de que será uma que traga uma mensagem positiva e tenha o cuidado para não desviar a atenção para si, neste momento o colaborador quer ser ouvido. 

4. Oferecer Apoio e Recursos

Após ouvir a declaração do colaborador, é importante oferecer apoio imediato, no entanto não se precipite, escute a necessidade do colaborador. 

Não se sinta obrigado a ter todas as respostas na primeira conversa, você pode informar ao colaborador que precisará de um tempo para buscar as respostas e já deixe marcado o retorno desta reunião, demonstrando desta forma seu comprometimento com a questão. 

O ideal é que o líder esteja preparado para ajudar o colaborador a acessar os recursos necessários, respeitando suas escolhas e ritmo. Isso pode incluir indicar recursos internos, como o departamento de recursos humanos ou programas de assistência aos funcionários (PAEs), ou fornecer informações sobre serviços externos, como terapia.

5. Flexibilidade e Acomodações

Em muitos casos, os colaboradores que enfrentam problemas de saúde mental podem precisar de ajustes em suas responsabilidades ou horários de trabalho. 

O líder deve ser flexível e disposto a discutir acomodações razoáveis que possam ajudar o colaborador a gerenciar seu problema de saúde enquanto continua a contribuir para a organização. Isso pode incluir a implementação de horários flexíveis, trabalho remoto ou a redistribuição temporária de tarefas, para tanto o líder deverá contar com o apoio da alta gestão da organização, bem como com o apoio dos Recursos Humanos.

Nestes casos é importante manter o RH envolvido na negociação para assegurar que as leis trabalhistas nacionais e diretrizes organizacionais estejam sendo cumpridas, além de garantir os direitos deste colaborador. É igualmente importante ter consciência de que as diretrizes das empresas são escritas para as condições “normais de estresse e pressão” e nem sempre abordarão questões relacionadas a situação atual do colaborador, portanto pode ser necessário pensar em soluções para além das diretrizes atuais, o que pode levar ao questionamento de outros colaboradores, para tanto Goldberg sugere estar preparado para responder questionamentos desta ordem sem expor o colaborador em questão e, Goldberg sugere ainda que a reposta possa ser acordada com o próprio colaborador, para que se sinta parte deste processo e desta forma tenha certeza de que não será exposto. 

6. Peça ajuda

Líder, você não está sozinho!

“Não lhe cabe agir como terapeuta, médico ou advogado” afirma Greenwood. 

Procure trabalhar em parceria com a área de recursos humanos, espera-se que esta área esteja capacitada para apoiar o líder e o colaborador. 

“A pesquisa de Goldberg mostra que as empresas menores têm a capacidade de oferecer maior flexibilidade. Por outro lado, a situação pode ser mis desafiadora, uma vez que você talvez não tenha condições de atender às solicitações do funcionário.” 

7. Monitoramento Contínuo e Comunicação Aberta

O apoio a um colaborador com problemas de saúde mental não termina após a conversa inicial. É crucial que o líder continue monitorando a situação, mantendo canais de comunicação abertos e acessíveis. Isso pode ser feito através de check-ins regulares, onde o líder demonstra preocupação e disposição para ajudar conforme necessário. No entanto, o líder deve ser cuidadoso para não ser invasivo, respeitando o espaço pessoal do colaborador.

“Greenwood enfatiza a importância de líderes e gerências conversarem com franqueza sobre o assunto. Não é necessário falar do próprio problema de saúde mental, caso você enfrente um, mas é possível falar de um filho com problemas para dormir ou de preocupações com burnout. É importante mostrar que gerentes são falíveis e humanos”. (Gallo, 2023). 

8. Outros recursos, quando disponíveis 

O tratamento clínico é fundamental para os casos de problemas relacionados à saúde mental, e deve ser realizado exclusivamente por profissionais da área. 

Como forma de potencializar o tratamento clínico, outros recursos podem ser adotados como musicoterapia, arteterapia, atividades físicas, a prática de meditação, entre outras abordagens. 

A médica psiquiatra Nise da Silveira (1905-1999) “(…) foi pioneira ao introduzir, no Brasil, a terapia ocupacional baseada em expressões artísticas – e seu legado segue como uma das mais belas e potentes contribuições para o entendimento do inconsciente humano.” (SESC, 2022). 

9. Educação e Sensibilização

Líderes eficazes também reconhecem a importância de educar a si mesmos e suas equipes sobre questões de saúde mental. Compreender os sinais de estresse, ansiedade, depressão, burnout e outras condições pode ajudar os líderes a identificar problemas antes que se agravem. A sensibilização para a saúde mental no local de trabalho contribui para a criação de um ambiente onde os colaboradores se sintam apoiados e encorajados a procurar ajuda sem medo de estigmas.

10. Promover uma Cultura de Inclusão e Apoio

Um líder que reage de maneira compassiva e proativa à declaração de um problema de saúde mental ajuda a criar uma cultura de trabalho inclusiva e solidária. Isso significa fomentar um ambiente onde todos os colaboradores se sintam valorizados e apoiados, independentemente dos desafios que enfrentam. A cultura de uma organização é um reflexo de suas lideranças; portanto, o comportamento dos líderes em relação à saúde mental pode influenciar significativamente o bem-estar e o desempenho de toda a equipe.

11. Planejamento de Retorno ao Trabalho

Se o colaborador precisar se ausentar devido a problemas de saúde mental, o líder deve colaborar no planejamento de um retorno ao trabalho que seja gradual e bem-estruturado. O plano deve ser desenvolvido em conjunto com o colaborador, levando em consideração suas necessidades e limitações. Esse retorno deve ser acompanhado de perto, com ajustes sendo feitos conforme necessário para garantir que o colaborador se reintegre ao ambiente de trabalho de maneira saudável e sustentável.

12. Adotar uma Abordagem Preventiva

Além de responder a problemas de saúde mental quando surgem, os líderes devem adotar uma abordagem preventiva, criando um ambiente de trabalho que minimize as causas de estresse e promova o bem-estar mental. Isso pode incluir políticas de equilíbrio entre vida profissional e pessoal, promoção de atividades físicas e de relaxamento, e a garantia de que as cargas de trabalho sejam gerenciáveis.

13. Ser um Exemplo de Autocuidado

Por fim, os líderes devem ser modelos de autocuidado e bem-estar mental. Demonstrar que valoriza a saúde mental, tomando medidas para cuidar de si mesmo, envia uma mensagem poderosa aos colaboradores. Isso ajuda a normalizar as conversas sobre saúde mental e reforça a ideia de que é aceitável e necessário buscar ajuda quando necessário.

Conclusão, a maneira como um líder reage a uma declaração de problemas de saúde mental pode ter efeitos de longo alcance, tanto para o colaborador individual quanto para toda a equipe. Ao agir com empatia, respeito e prontidão para oferecer apoio, o líder não apenas ajuda o colaborador a superar seus desafios, mas também fortalece a coesão e a resiliência da organização como um todo. Implementar essas estratégias e promover uma cultura organizacional que valorize a saúde mental é um passo essencial para o sucesso sustentável de qualquer empresa.

Saiba mais e assista a Live em: 

Referências Bibliográficas:

Ferreira, M. Conheça Nise da Silveira, pioneira no uso da arte como terapia psiquiátrica. Sesc São Paulo, 2022. Disponível em: https://www.sescsp.org.br/coracao-liberto-perfil-da-medica-nise-da-silveira-e-seu-olhar-revolucionario-para-a-arte-como-terapia/Acesso em: 15 de agosto de 2024.

GALLO, A. Quando um funcionário compartilha um problema de saúde mental in: Harvard Business Review: Como melhorar a saúde mental no trabalho. 1.ed. Rio de janeiro: Sextante, 2023. Capítulo 11, p. 112 a p. 121.  

Foto de: https://pixabay.com/pt/photos/ariadna-oltra-artur-mas-catalonia-883879/

Imagem de WikimediaImages por Pixabay

Tathy Neder

Psicóloga, especialista em consultoria interna e desenvolvimento humano e organizacional.

Coach Executivo, de Carreira, de Equipes e Grupos,

Consultora, Facilitadora e Mentora de

DHO, Liderança e Carreira.

Facilitadora de Segurança Psicológica.

Chief Happiness Officer.

tathyneder@coaching4action.com

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